Como os estudiosos e professores adventistas do sétimo dia deveriam tratar os eventos históricos de um período de guerra, violência e crueldade em nome da religião, como as guerras religiosas francesas, quando a maior parte da violência e maldade parece vir mais de um lado? Como podemos fazer justiça à realidade histórica sem parecer perpetuar uma narrativa protestante triunfalista e polêmica da história? Podemos modelar objetividade para nossos alunos e ainda honrar o espírito dos reformadores?

Um problema com o ensino da Reforma

Os professores de história adventistas do sétimo dia enfrentam um problema quando se trata de ensinar a Reforma. Somos membros de uma denominação que, desde suas origens norte-americanas, em meados do século 19, sempre desacreditou a Igreja Católica Romana em geral; isso quando não foi totalmente hostil a ela. Especificamente, nossa visão tanto dos reformadores do século 16 quanto da era que leva seu nome tende a ser essencialmente a da historiografia protestante tradicional.1 Quando se trata da história desses eventos, somos confessionalmente partidários.

No entanto, a disciplina de História, talvez mais do que qualquer outra das humanidades, exige objetividade e distanciamento dos professores e pesquisadores de suas próprias suposições sobre o assunto. Na literatura inglesa, tal como praticada hoje, é perfeitamente legítimo que um texto seja lido de perspectivas variadas ou tenha múltiplas interpretações. Na antropologia, o conceito de “distância” entre pesquisador e sujeito é cada vez mais percebido como um legado do imperialismo e o conceito da reflexividade, ou seja, o efeito que um grupo de sujeitos tem sobre um pesquisador que se torna verdadeiramente parte daquele grupo, é a nova palavra de ordem.

Na história, porém, a objetividade ainda é vital. Isso não quer dizer que os historiadores imaginem que chegam a um assunto sem ideias preconcebidas; mas o historiador deve fazer tudo ao seu alcance para colocar esses preconceitos de lado e ser objetivo. Este não é um problema apenas para os historiadores adventistas que publicam ativamente; a objetividade e o desapego acadêmico pela disciplina são tão intrínsecos que os professores devem inevitavelmente exemplificá-la em sala de aula, ou então não estão ensinando história verdadeira.

Um problema particular com a objetividade surge quando o professor ou pesquisador adventista se envolve com as guerras religiosas europeias que se seguiram à Reforma e que duraram aproximadamente desde meados do século 16 até meados do século 17. Os professores não são apenas confrontados com uma série de atrocidades, todas realizadas em nome do Cristianismo; eles também descobrem que a maior parte dos assassinatos e do caos teve sua origem com os adeptos da Igreja de Roma. Existe uma maneira de sermos igualmente fiéis à nossa disciplina, às evidências e à nossa fé?

Acho que sim, e este artigo explora uma abordagem, tomando o exemplo das guerres de religion: as guerras religiosas na França (1562-1598). Minha abordagem de como isso pode ser ensinado baseia-se não apenas na evidência histórica, mas também no reconhecimento franco de minha própria formação e consequentes preconceitos.2

Minha abordagem reflete também minha crença de que nem os adventistas do sétimo dia em particular nem os protestantes em geral têm o monopólio exclusivo de um relacionamento com Deus. E, como parte integrante do adventismo do sétimo dia, reconhecer que Deus nos revelou verdades ignoradas por membros de outras denominações cristãs deixa claro que ainda não temos uma compreensão completa da verdade divina. Em consequência, quando estamos na sala de aula, é impróprio ensinar uma narrativa triunfalista ou hostil sobre qualquer tradição cristã individual. Devemos reconhecer que Deus foi honrado (e por fim honrará) por pessoas de todas as denominações.3

Essa abordagem nos permite honrar os padrões profissionais (ensinando e publicando história objetiva) e os padrões cristãos. Os dois podem ser complementares, em vez de contraditórios, mesmo quando se considera a Reforma ou guerras religiosas.

Preconceitos pessoais

Meu primeiro contato com as guerras religiosas da França ocorreu quando eu era menino, e minha visão foi moldada por duas influências formativas similares, mas diferentes. Meu pai era um pastor adventista do sétimo dia de segunda geração e, portanto, os livros de história da família que eu consumia quando criança e adolescente deixavam bem claro que os protestantes eram os mocinhos, e os católicos, os bandidos. Mas houve uma influência adicional e específica em como eu pensava sobre a Reforma na França – uma que tenho certeza de que compartilho com muitos outros professores adventistas de colégio e faculdade.

Walter C. Utt, ilustre historiador de longa data do Pacific Union College, não transformou sua pesquisa detalhada sobre os huguenotes do reinado de Luís XIV em monografias acadêmicas; em vez disso, ele escreveu dois romances históricos cuidadosamente precisos para adolescentes e juvenis, capturando vividamente o mundo francês reformado da metade para o final da década de 1680, quando a liberdade religiosa na França foi destruída. Esses livros eram muito populares. Cresci lendo-os e, como resultado, a Revogação do Édito de Nantes foi um evento reconhecível para mim desde muito jovem.

Os romances de Utt foram ambientados décadas após o fim das guerras religiosas, mas, por causa de seu conteúdo, minha imaginação infantil foi capturada pelo heroísmo e drama das batalhas dos huguenotes; minhas simpatias também foram capturadas pelo fato de que parecia que o lado certo tinha vencido. Assim, instintivamente identifiquei os huguenotes como duplamente “mocinhos”. Quando li pela primeira vez que a cavalaria do Príncipe de Condé na Batalha de Dreux (1562) estava principalmente vestida de branco (provavelmente batinas, sobre sua armadura completa), parecia apropriado. Portanto, Utt certamente influenciou como eu via o período anterior.

À medida que envelheci e estudei o início da história moderna na faculdade e, em seguida, pesquisei as guerras religiosas da França para meu doutorado, é claro que descobri que as campanhas das guerras eram cheias de atos sangrentos de covardia, crueldade e brutalidade e, junto a isso, o fato de que a guerra formal, a violência informal e comunal eram endêmicas, na qual a brutalidade e a crueldade eram ainda mais comuns. Então, até que ponto as influências da minha juventude ainda me afetam? Até certo ponto, não importa. Os historiadores da era da Reforma tenderam a vir de posições confessionais claras, mas, desde que reconhecessem isso (e permitissem), isso não tornava seu trabalho menos crível ou historicamente respeitável. Em qualquer caso, muitos poucos historiadores cristãos modernos, independentemente de suas influências formativas ou preconceitos instintivos, transportam as inimizades confessionais históricas que estudam para os dias atuais ou para a vida pessoal deles.

Se a maioria dos adventistas do sétimo dia estão, como eu, ainda torcendo (em alguma parte de nossa mente) pelos reformadores e seus seguidores ao ler relatos históricos dos séculos 16 e 17, provavelmente muitos de nós gostariam de se reconciliar com os católicos romanos em nível pessoal, embora não em nível institucional, eclesiológico ou teológico. Então, também, aqueles que lideram a disciplina de História, seja no nível médio ou superior, estão bem cientes do imperativo profissional de ser objetivo.

Existem muitos fatores, então, que levam os historiadores cristãos da Reforma da Europa a buscar se distanciar das pessoas que eles estudam. No entanto, as guerras religiosas francesas representam um problema particular para os historiadores protestantes porque, em seus estudos sobre as guerras religiosas, fatos históricos e preconceitos pessoais parecem se confundir.

Repressão e perseguição católicas

Ao considerar o registro da violência religiosa no final do século 16, na França, a culpa parece recair esmagadoramente sobre os católicos romanos.

Na década de 1540, houve execuções em massa de protestantes em muitas cidades francesas. Embora tenham sido procedimentos quase judiciais contra pessoas condenadas por heresia, eles são impressionantes por causa do número de mortos. E foram sucedidos por atos de brutalidade menos formais e mais massivos. Em 1561, por exemplo, quando hereges condenados foram libertados por decreto real como parte de uma tentativa de curta duração de se chegar a um acordo, na cidade de Marsillargues, uma multidão católica os cercou “e os executou e queimou nas ruas”.4

Então, em 1562, a primeira guerra civil/guerra religiosa foi desencadeada pelo massacre de uma congregação inteira de huguenotes que adoravam em um celeiro fora da pequena cidade de Vassy. Foi o primeiro de muitos massacres, dos quais o Massacre do Dia de São Bartolomeu, em Paris (24 de agosto de 1572), é apenas o mais conhecido e terrível. Em menos de 24 horas, cerca de 3 mil huguenotes, incluindo mulheres, crianças e idosos, foram assassinados (algo pelo qual o papa João Paulo II cuidadosamente evitou se desculpar durante sua visita a Paris em agosto de 1997, quando provocativamente celebrou uma missa pública no Dia de São Bartolomeu).

Nas semanas que se seguiram ao massacre em Paris, 2 dois mil e 5 mil huguenotes foram mortos em toda a França quando a notícia do massacre chegou às cidades do país. Isso desencadeou massacres de imitação das populações protestantes locais. Em Bordeaux, os assassinatos ocorreram depois que um jesuíta pregou um sermão “sobre como o Anjo do Senhor já havia executado o julgamento de Deus em Paris, Orléans e em outros lugares e o faria em Bordeaux”.5

Em outros lugares, porém, os massacres muitas vezes não aconteciam no sangue quente do fervor religioso – o grau de cálculo às vezes é assustador. Em Rouen, por exemplo, muitos dos huguenotes estavam na prisão, e fanáticos católicos invadiram a prisão “e os massacraram sistematicamente”.6 Em Lyon, os principais assassinos católicos exibiram publicamente suas roupas ensanguentadas nas ruas, demonstrando mais arrogância que arrependimento.

Onde os católicos não tinham número ou confiança para tentar subjugar todos os seus rivais confessionais pela espada, eles usaram outras táticas. Assim, em Sens, em 1562, uma turba, vinda tanto da cidade quanto das aldeias vizinhas, confrontou os calvinistas que saíam da igreja e os engajou em “uma batalha sangrenta”.7 Em Lyon, no mesmo ano, meninos católicos apedrejaram fiéis protestantes em seu caminho para o serviço. Em Pamiers, em 1566, uma sociedade jovem realizando um ritual em homenagem ao Pentecostes entrou no bairro calvinista enquanto o pastor local estava pregando, então começou a cantar “‘mate, mate’8 e começou uma luta séria que deveria [durar] por três dias.”9

A violência se espalhou até mesmo nas campanhas organizadas das guerras civis nas quais, em teoria, o governo da guerra deveria ser aplicado. Mas Luís I de Bourbon, príncipe de Condé, líder da causa huguenote até 1569, foi assassinado enquanto tentava se render após ser retirado de seu cavalo na Batalha de Jarnac, em março de 1569. Dois outros generais huguenotes, Montgomery e Briquemault, tiveram negados seus direitos de prisioneiros após serem capturados em 1574 e, em vez disso, executados depois de lhes torturarem em uma roda – torturados judicialmente até a morte.10

Como destacou a ilustre historiadora americana Natalie Zemon Davis em seu importante estudo sobre a violência religiosa nas guerres de religion, a violência católica foi além do túmulo – não apenas os huguenotes foram mortos, mas seus cadáveres também foram profanados. Na Normandia e na Provença, “folhas da Bíblia protestante foram enfiadas na boca e feridas de cadáveres”.11 Em 1568, quando se espalhou a notícia de que um huguenote estava prestes a ser enterrado em um cemitério consagrado, “uma multidão correu para o cemitério, interrompeu o funeral e arrastou o cadáver para [...] o lixão da cidade”.12

O corpo do almirante de Coligny, célebre líder huguenote cujo assassinato foi uma das primeiras ações do massacre de São Bartolomeu, foi mutilado, apedrejado e pendurado em uma forca antes de finalmente ser queimado. Em Provins, em 1572, um cadáver huguenote tinha cordas amarradas ao pescoço e pés e foi então objeto de uma competição de cabo de guerra entre os meninos da cidade, antes de eles o arrastarem para ser queimado.32

Em outros lugares, era comum que corpos huguenotes fossem jogados nos rios ou queimados, mas os corpos também eram zombados e ridicularizados ao serem arrastados pelas ruas até o destino, e frequentemente “tinham seus órgãos genitais e internos cortados”.14

Tudo isso não é simplesmente material de propaganda; é um fato histórico bem documentado. É fácil, então, retratar os católicos nas guerras religiosas como uma força maligna, como opressores e perseguidores, com os calvinistas como vítimas que eventualmente se defenderam. Uma interpretação confessionalmente partidária da França do final do século 16 parece estar de acordo com as evidências.

Agressão e intolerância protestante

O enigma, então, é este: como fazemos justiça à realidade histórica das guerras religiosas sem cair em uma das duas armadilhas: por um lado, perpetuar as próprias divisões que resultaram em conflito brutal e sangrento na França do final do século 16, a qual para a maioria de nós seria inconsistente com nossa moralidade pessoal; mas, por outro lado, parece simplesmente estar elevando as visões partidárias ao nível de conclusão acadêmica, o que é profissionalmente inaceitável. Como os educadores adventistas devem ensinar o período com um espírito justo e de mente aberta quando os piores excessos estavam do lado católico?

É importante lembrar que os huguenotes não eram inocentes – eles eram um ingrediente ativo na receita do combustível que produziu a explosão de violência na França do final do século 16. Em Rouen, apenas em 1560 e 1561, “houve pelo menos nove incidentes diversamente descritos nos documentos como ‘tumultos,’ ‘motins’ e ‘sedições’[...] todos eles decorrentes de ações”15 dos huguenotes. Em Agen, em 1561, artesãos protestantes destruíram sistematicamente os altares e estátuas das igrejas católicas da cidade. Em Lyon, um sapateiro calvinista interrompeu o sermão de Páscoa pregado por um frade franciscano, gritando “Você mente” – uma afirmação pontuada pelos tiros de huguenotes que esperavam do lado de fora, na praça.16

Em toda a França, os protestantes frequentemente interrompiam as missas ou procissões de Corpus Christi para tomar a hóstia e depois esmigalhá-la diante de católicos indignados (para os quais, por acreditarem que era o corpo literal de Cristo, isso era uma blasfêmia horrível), proclamando-a “um deus de pasta” ou “um deus de farinha”, em vez do corpo real de Cristo.17 Padrões semelhantes eram repetidos com frequência: procissões religiosas católicas eram regularmente atacadas com lixo; eles, como os serviços religiosos, eram interrompidos por protestantes que cantavam salmos, assobiavam ou cantavam slogans; e frequentemente, as igrejas eram “limpas” com objetos ofensivos deliberadamente profanados com cuspe, urina e excremento antes de serem esmagados. Padres, monges e frades ou oficiais da lei que mantinham prisioneiros protestantes eram frequentemente espancados ou mortos e, ocasionalmente, torturados até a morte.18

Não foi apenas o que os huguenotes fizeram; é o que eles não fizeram. Eles não estavam dispostos a aceitar que os católicos também eram cristãos sinceros e não estavam dispostos a se comprometer em nenhum ponto. O mais influente defensor da tolerância de outros cristãos na França no século 16 foi um católico romano, Michel de L’Hospital, chanceler da França na década de 1560. Ele passou a acreditar, genuína e apaixonadamente, que a tolerância era o que era certo para os seguidores de Cristo, que, como escreveu L’Hospital, “amava a paz e nos ordenou que nos abstivéssemos da violência armada [...] Ele não queria obrigar e aterrorizar ninguém por meio de ameaças, nem atacar com espada”.19

Calvino realmente condenou a ação violenta dos huguenotes, exortando-os a não resistir, mas a sofrer perseguição de acordo com o modelo do Novo Testamento; eram os grandes nobres, que ele sentia terem um dever e responsabilidade na política francesa, a quem ele instava a ação em nome das igrejas reformadas francesas. Mas Calvino condenou o principal defensor calvinista da tolerância, Sebastian Castellio, por seus pontos de vista, e os principais pastores huguenotes fizeram o mesmo.20

A propósito, a disposição de Henrique de Navarra de se comprometer em alguns pontos a fim de encerrar o conflito foi um fator importante para encerrar as guerras, mas, ao fazê-lo, ele provocou a condenação de muitos huguenotes, tanto líderes quanto as bases. Claro, Henrique agiu como fez em parte para progredir, a fim de ser rei incontestado da França (que ele se tornou como Henrique IV). No entanto, ele também queria genuinamente encerrar décadas de conflito confessional; e parece provável que isso não poderia ter sido alcançado sem alguns compromissos.

Muitos huguenotes achavam que Henrique deveria, em vez disso, ter demonstrado fé em Deus, desafiado a lógica humana, e um milagre poderia ter ocorrido. Meu próprio instinto, de fato, é dizer, com Pedro e os outros apóstolos: “Antes, importa obedecer a Deus do que aos homens.”21 No entanto, em última análise, a disposição de Henrique de renunciar foi vital para acabar com a violência religiosa. Qual curso de ação, então, estava mais de acordo com o exemplo de nosso Senhor? É uma questão desconcertante.

A natureza da violência religiosa francesa nos primórdios da modernidade

Nada disso muda o fato de que os huguenotes foram muito mais alvo de pecado do que pecadores na França do século 16. A intolerância da maioria católica romana foi o motor que impulsionou o conflito religioso na França.22 Como Natalie Zemon Davis apontou há quase 30 anos, havia uma clara diferença qualitativa entre a violência de calvinistas e católicos.23

Os calvinistas queriam mudar a opinião da maioria da população e, por isso, destruíram objetos sagrados para mostrar que não eram realmente sagrados e mataram padres porque os perceberam como se estivessem desencaminhando o povo. Os católicos, porém, queriam se livrar de uma grande proporção da população que consideravam poluição ou câncer. É por isso que cerca de 3 mil huguenotes puderam ser mortos em Paris em 24 horas em 24 e 25 de agosto de 1572, um paralelo assustador com os quase 3 mil mortos em três ataques em 11 de setembro de 2001, pessoas cuja religião os tornou igualmente além da simpatia de seus assassinos (em número bem menor).24 Para os católicos romanos franceses, os huguenotes eram o problema, matá-los era o primeiro passo para recuperar o favor divino. Em suma, enquanto a violência católica era dirigida contra as pessoas, a violência calvinista era amplamente dirigida contra as coisas. Portanto, foi inerentemente sempre mais limitada do que a violência católica.

No entanto, os fatos cruciais são que os calvinistas ainda perpetraram violência: eles assassinaram padres e eram culpados de intolerância e opressão. Embora a distinção entre as duas formas de violência seja importante, estamos, por assim dizer, falando aqui do menor dos dois males, não de um contraste entre o bem e o mal.

Conclusão

Há uma parte de mim que estremece ao ler a narrativa da Batalha de Coutras de Agrippa d’Aubigné (o ilustre historiador huguenote, que registrava acontecimentos de que havia participado),25 sabendo que tanto a arrogância presunçosa do exército da Liga Católica quanto a esmagadora superioridade numérica em que se baseava estavam prestes a ser destruídos pela superioridade moral da cavalaria huguenote em menor número, mas zelosa, cantando o Salmo 118 enquanto atacava. Mas há também uma parte de mim que se emociona ao ler o apelo sincero e evangélico de Michel de L’Hospital para a aceitação de pontos de vista alternativos e que reconhece que L’Hospital, um devoto seguidor de Roma, estava mais próximo do espírito dos Evangelhos do que muitos seguidores da Reforma.

Existiria então um ponto fundamental sobre as Guerras Religiosas da França que nós, como cristãos, deveríamos ter em mente ao pesquisar e para o qual deveríamos chamar a atenção de nossos alunos enquanto ensinamos? Eu sugiro que este é o ponto em que protestantes e católicos falharam: viver de acordo com os elevados padrões de nosso Senhor e Salvador, que declarou: “Ouvistes que foi dito: [...] odiarás o teu inimigo. Eu, porém, vos digo: amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem.”26 Meus próprios fracassos recorrentes para viver esse ideal deveriam me tornar tardio em condenar ambos os lados como sendo menos cristãos do que eu. O caminho certo, talvez, tanto como cristão quanto como historiador seja, em vez disso, tentar entender por que tantos crentes firmes podem agir de forma tão contrária aos desejos do Fundador e dos fundamentos do cristianismo. O resultado de tal abordagem será uma história sensível e objetiva que produz uma compreensão aprimorada do passado. Também será, creio eu, uma história genuinamente cristã.

Este artigo foi revisado por pares.

D. J. B. Trim

D. J. B. Trim, PhD, FRHistS, é diretor do Escritório de Arquivos, Estatística e Pesquisa na Associação Geral dos Adventistas do Sétimo Dia, em Silver Spring, Maryland, Estados Unidos. Ele possui um BA (Newbold College, Bracknell, Inglaterra ) e um PhD em História (King’s Colleg,e em Londres). Educador experiente, o Dr. Trim lecionou no Newbold College e no Pacific Union College, onde ocupou a cátedra Walter C. Utt de História. Eleito Fellow da Royal Historical Society, ele tem sido professor visitante na Biblioteca Huntington, na Biblioteca Folger Shakespeare, na Universidade da Califórnia em Berkeley e na Universidade de Reading, no Reino Unido. Ele é autor de mais de 150 artigos em jornais, revistas e livros acadêmicos e populares e coeditou mais de 10 livros.

Citação recomendada:

D. J. B. Trim, “As guerras religiosas francesas e o problema do ensino da história confessionalmente partidária,” Revista Educação Adventista 83:3 (2021). Disponível em: https://www.journalofadventisteducation.org/pt/2021.83.3.3.

NOTAS E REFERÊNCIAS

  1. Ver Reinder Bruinsma, Seventh-day Adventist Attitudes Toward Roman Catholicism 1844-1965 (Berrien Springs, Mich.: Andrews University Press, 1994).
  2. Este artigo se baseia em uma exploração anterior dessas questões, realizada a convite da Sociedade Holandesa de Historiadores Cristãos: D. J. B. Trim, “De Franse godsdienstoorlogen en de uitdaging voor partijdige geschiedenis,” Transparant: Tijdschrift van de Vereniging van Christen–Historici 17:3 (2006): 4-8.
  3. Ver Ellen G. White, Counsels to Writers and Editors (Nashville, Tenn.: Southern Publishing Assn., 1946), 35, 60, 63-65.
  4. Natalie Zemon Davis, “The Rites of Violence: Religious Riot in Sixteenth-century France,” Past and Present 59 (1973): 51-91; reproduzido em Society and Culture in Early Modern France: Eight Essays (Stanford, Calif.: Stanford University Press, 1975), que é a versão citada aqui (da página 163 em diante) e daqui em diante.
  5. Ibid., 167.
  6. Ibid., 165.
  7. Ibid., 172.
  8. Ibid., 173.
  9. Ibid., 183; Philip Benedict, Rouen During the Wars of Religion (Cambridge & New York: Cambridge University Press, 1981), 128.
  10. Ibid.
  11. Davis, “The Rites of Violence,” 157.
  12. Ibid., 162.
  13. Ibid., 163.
  14. Ibid., 179; Benedict, Rouen During the Wars of Religion, 64, 67.
  15. Benedict, Rouen During the Wars of Religion, 58.
  16. Davis, “The Rites of Violence,” 163, 164.
  17. E.g., ibid., 156, 157, 171; Benedict, Rouen During the Wars of Religion, 61.
  18. Davis, “The Rites of Violence,” 157, 158, 160, 171, 173, 174, 179-181, 183; Benedict, Rouen During the Wars of Religion, 60-63, 67.
  19. Citado po Loris Petris, “Faith and Religious Policy in Michel de L’Hospital’s Civic Evangelism,” The Adventure of Religious Pluralism in Early Modern France, Keith Cameron, et al., eds. (New York, Oxford & Bern: Peter Lang, 2000), 137.
  20. Ver Hans R. Guggisberg, Sebastian Castellio, 1515-1563: Humanist and Defender of Religious Toleration in a Confessional Age (Burlington, Vt.: Ashgate, 2003).
  21. Atos 5:29. Todas as citações das Escrituras neste artigo são extraídas da versão Almeida Revista e Atualizada.
  22. Como Ellen White apontou; ver The Great Controversy Between Christ and Satan (Mountain View, Calif.: Pacific Press, 1911), 276, 277.
  23. Davis, “The Rites of Violence,” especialmente p. 174.
  24. Cf. H. H. Leonard, “The Huguenots and the St. Bartholomew’s Massacre,” The Huguenots: History and Memory in Transnational Context: Essays in Honour and Memory of Walter C. Utt, David J. B. Trim, ed. (Leiden & Boston: Brill, 2011), 65, 66.
  25. Théodore-Agrippa d’Aubigné, Histoire Universelle, ed. Alphonse de Ruble (Paris: Librarie Renouard, 1893), 7:161. Originalmente publicado entre 1616 eyu7 1620).
  26. Mateus 5:43, 44.