Tentei me livrar dele. Eu realmente tentei, mas não havia como evitar o requisito. Se eu quisesse obter o certificado de professor denominacional, teria que fazer o curso “O Dom de Profecia”, também conhecido entre meus colegas como o “curso de Ellen White”. Para piorar a situação, o curso estava sendo oferecido apenas às 7 horas da manhã de segunda a sexta-feira, numa modalidade intensiva em um verão quente e úmido. Dizer que eu temia a experiência seria um eufemismo. Imaginei palestras longas e monótonas, cheias daquela ladainha de “Ellen White disse isso ou disse aquilo”, e uma ênfase esmagadora nos eventos do tempo do fim e no preparo para a crise final, porque infelizmente, até esse momento, essa tinha sido minha experiência com Ellen White e a profecia nas escolas adventistas. Ela era para mim o que era para muitos da minha geração: uma figura mística, um espectro de julgamento, uma vara de correção.
Felizmente, minhas expectativas estavam erradas. O professor do curso, um gentil contador de histórias, bem-humorado e talentoso, iniciava cada período de aula com uma breve reflexão sobre uma passagem das Escrituras, após a qual ele liderava uns hinos da fé, canções velhas e favoritas, e aquelas que aprenderíamos ao longo do curso. Ele compartilhava histórias convincentes e humanizadoras sobre a vida dos pioneiros adventistas, histórias que revelavam pessoas reais com fraquezas humanas nas experiências de relacionamento, algumas bem-humoradas, outras trágicas e outras ainda que demonstravam sua paixão e amor por Jesus Cristo e uma vontade de sacrificar tudo o que possuíam para espalhar as “boas-novas”. Bem versado na história adventista, ele se divertia ao compartilhar histórias que rasgavam a fachada de absoluta piedade por trás da qual muitos dos pioneiros são tão cuidadosamente envolvidos. Nós o desafiávamos com perguntas sobre o que ouvimos ou que alguém alegava, como: “Ellen White disse...”, e ele respondia, direcionando-nos para passagens em que poderíamos ler juntos o que ela realmente disse e em que contexto. Suas respostas eram gentis; sua conduta, autêntica. Escrevemos reflexões e cavamos fundo para descobrir nossos preconceitos, esperanças e aspirações e, ao final desse curso, muitos encontraram parentesco com os primeiros pioneiros adventistas.
O que eu também não previa era o impacto que esse curso teria no meu crescimento pessoal e profissional durante aquele verão quente e úmido, e depois dele também. Sob a orientação de um professor atencioso e gentil, eu, juntamente com centenas de futuros educadores adventistas ao longo dos muitos anos desde então, adquirimos não apenas o conhecimento do dom de profecia, mas também uma perspectiva equilibrada dos escritos de Ellen White em relação às Escrituras,1 uma apreciação mais profunda por seus escritos e sua compreensão pessoal de seu papel e seu próprio ministério,2 e uma afirmação do plano de Deus para cada ser humano individual, especialmente aqueles que responderam ao chamado para ensinar.3
Mais de 20 anos depois, em setembro de 2019, tive o privilégio de me juntar a 73 educadores adventistas de todo o mundo em uma Turnê de Estudos da História Adventista, patrocinada pelo Departamento de Educação da Associação Geral. Por 10 dias, visitamos vários locais históricos adventistas. Não apenas lemos e ouvimos histórias sobre os pioneiros adventistas, mas também visitamos os lares preservados ou reconstruídos onde eles viveram; andamos pelas ruas por onde eles andaram, experimentamos como poderia haver sido sua vida e os desafios do dia a dia que eles provavelmente enfrentaram. Juntos, ponderamos uma questão recorrente: “Como eles conseguiram tanto com tão pouco?” Cada um de nós ficou emocionado com o legado de comprometimento com a causa de Cristo e a busca pela verdade, e nos juntamos a eles na expectativa do dia em que nossos “passos cansados nunca vagarão – nossas provações passadas, nossas alegrias completas”, e estaremos “seguros no lar de nosso Pai”.4
Os artigos desta edição exploram uma variedade de tópicos. Barbara Fisher escreve sobre o importante papel que os professores têm na criação de experiências específicas por idade que podem ajudar a levar os alunos a um relacionamento com Deus. Ela discute vários fatores que influenciam sua prontidão para tal experiência e barreiras que eles possam encontrar. Enfatiza o valor de cuidar e nutrir professores que modelam a experiência cristã com autenticidade.
Três artigos analisam diferentes aspectos das contribuições de Ellen White à filosofia adventista da educação. Anna Galeniece explora as dimensões escatológicas da educação adventista nos escritos de Ellen White; e, em Perspectivas – uma seção dedicada a tópicos desafiadores na educação adventista e como os educadores os abordam, Derek Bowe compartilha suas reflexões sobre Ellen White, ficção e sua própria resposta ao longo dos vários estágios de sua jornada profissional de ensino. Um terceiro artigo, de Chantal Klingbeil, intitulado “Apresentando Ellen White a uma nova geração”, é uma reimpressão do Boletim da Comissão Executiva, uma publicação da Associação Geral dos Adventistas do Sétimo Dia. Klingbeil oferece oito sugestões úteis para introduzir uma nova geração nos escritos de Ellen White de maneira cuidadosa, relevante e significativa.
Os destaques da Turnê de Estudo da História Adventista são recontados em um pequeno ensaio fotográfico que recapitula, através de narrativas e fotos, as experiências dos participantes; o segundo pequeno ensaio apresenta o “Projeto de Restauração da Little Red School House”, um projeto apoiado pelos presidentes das universidades e instituições adventistas do sétimo dia para financiar a restauração da antiga escola na fazenda de Guilherme Miller. As escolas e instituições interessadas em participar encontrarão informações sobre como fazê-lo nesse artigo.
Os artigos restantes incluem uma resenha de Frank Hardy – um recurso que estamos reintroduzindo depois de algum tempo – do livro Caminos que no se olvidan (Caminhos que não se esquece), de Jorge Platon Maquera Sosa, uma coleção de 22 histórias de estudantes sobre como a educação adventista do sétimo dia transformou a trajetória de vida de cada um; um artigo de Melhores Práticas no Trabalho, de Javier Girarte Guillén, sobre o poder e os benefícios das visitas domiciliares; e, finalmente, um artigo que aborda um tópico sério para professores e administradores educacionais à medida que eles continuam seu crescimento profissional: “Evitando títulos falsos e fábricas de diplomas: recomendações para educadores e administradores acadêmicos”, de Sydney Freeman Jr., Ibrahim Karkouti e Ty-Ron Douglas.
Seus comentários serão bem-vindos e convidamos você a nos escrever.5 Seja um artigo completo, uma resenha de livro ou uma contribuição às seções de destaque: Melhores Práticas no Trabalho ou Perspectivas, sua contribuição para a REVISTA EDUCAÇÃO ADVENTISTA pode ser uma fonte de inspiração para o professor e administrador iniciantes ou um tesouro de novas ideias para aqueles que já estão em serviço. Estamos ansiosos para ouvir você!
Citação recomendada:
Faith-Ann McGarrell, “‘Ellen White disse...’: dissipando mitos e reafirmando a fé” Revista Educação Adventista 82:1 (janeiro a março de 2020). Disponível em: https://www.journalofadventisteducation.org/pt/2020.82.1.1.
NOTAS E REFERÊNCIAS
- Para mais informações, consulte Ellen G. White Estate®, “How Do Ellen G. White's Writings Relate to the Bible? The Authority of Ellen G. White's Writings” (2020). Disponível em: https://whiteestate.org/legacy/issues-scripint-html/; Os Escritos de EGW, “The Position of ‘The Bible, and the Bible Only’ and the Relationship of This to the Writings of Ellen White” (2020). Disponível em: https://m.egwwritings.org/en/book/741.111.
- Veja também, Ellen G. White Estate®, “Ellen G. White’s Understanding of How Her Writings Relate to Scripture” (2020). Disponível em: https://whiteestate.org/legacy/issues-scripegw-html/.
- Ellen G. White, Educação (Tatuí: Casa Publicadora Brasileira, 2003). Veja especificamente os capítulos, “O Mestre Enviado de Deus” (p. 75-83) e “Uma Ilustração de Seus Métodos” (p. 84-96), e a seção “Os Mestres Subalternos” (p. 275-287), em que os professores em treinamento são incentivados a meditar nas promessas de Deus encontradas em Apocalipse 3:8; Salmo 32:8; Mateus 28:20; e 2 Coríntios 3:18.
- Annie R. Smith, “How Far from Home?” in The Gospel in Song (Takoma Park, Md.: Review and Herald, 1926), 198. Disponível em: http://www.hymnary.org/text/how_far_from_home_i_asked_as_on.
- Visite https://www.journalofadventisteducation.org/en/for-authors para obter uma visão geral completa das diretrizes para escrever e enviar um artigo para consideração, juntamente com uma lista dos tópicos preferidos.